quinta-feira, 27 de maio de 2010

VIRADA, VIRAÇÃO, VIRADOR


O que é pior?
Colocar num só dia um monte de artistas se apresentando do jeito que der, ou seja -se virando, um por cima do outro e gastar nisso uma verba que daria para engrossar o caldo ralo dos editais já conquistados durante o ano todo
ou
não reconhecer que faltam pessoas preparadas para lidar com acontecimentos culturais e parar tudo, até termos teatros e locais em condições de receber a arte em todas as suas manifestações e formar pessoas que respeitem os artistas e saibam diferenciar uma manifestação de outra - um show de rock tem necessidades especificas que uma apresentação de dança-teatro não tem.

Que não tenhamos programadores de ocasião, eletricistas de ocasião, iluminadores de ocasião, contra regra de ocasião, motoristas e seguranças de ocasião, só pra ganhar uns trocados e depois nada. O resto do ano os teatros mofam, o cupim come, os refletores voltam para as mãos dos terceirizados, bem como os equipamentos de som. Ficam os urdimentos ( quando existem) rotos, as madeiras podres e as poltronas poidas. Fica tudo às moscas. Sem manutenção, sem verba, sem vontade, sem dignidade.

Mas... o ano que vem..a virada volta! e os lanchinhos com formiga reaparecem, os salões de cabeleireiros se enchem, pois nós organizadores temos que nos apresentar bem. E as recomendações se repetem: nada de atrasos viu? Artista é tudo folgado- não dê moleza. Meia hora entra uma apresentação e outra dá muito bem pra eles arrumarem tudo. A gente abre a porta e eles que se danem. A virada é assim. Eles tem que colaborar. Quer o quê?

A total falta de entendimento do que é arte ou a total falta de politicas publicas de longo prazo andam juntas. Em Paris (desculpem o exemplo, mas dizem que a virada se inspirou nas Noites Brancas) esse dia é um dia de congrassamento da arte e de seus organizadores, pois as politicas publicas são de longo prazo e quando muda o prefeito não mudam aqueles que trabalham com a cultura.

No interior de São Paulo ou na capital as cenas se repetiram. O publico não sabe dos bastidores, mas não dá pra continuar assim.

A Virada Cultural tem que respeitar os artistas que se apresentam na rua ou nos palcos. É preciso oferecer condições mínimas para que as apresentações aconteçam de forma segura.

Em Bauru havia tantos enganos que iam da mais pura desorganização até a mais efetiva falta de segurança: fios aos montes expostos nos palco e cobertos com tapete(!) , refletores em quantidade esquentando o palco de forma absurda e ligados em potência máxima deixando a platéia no claro. Isso para resumir o que foi a experiência da Cia Artesãos do Corpo com Cordeiro no palco de Bauru. Outros artistas se recusaram a continuar suas apresentações ou perderam a paciência com o despreparo daqueles que estavam lá pra desorganizar a viração.

E "eles" seguem incontinentes com a viração: nos convidaram para apresentar duas peças para espaços urbanos no Circuito Cultural Paulista. Até ai tudo bem. Mas sabe como? uma atrás da outra no mesmo dia e hora! Ao questionarmos a secretaria de estado da cultura ouvimos: tem que ser assim. E a arte? E os vídeos que mandamos mostrando como é cada peça? Como podemos apresentar uma peça atrás da outra? a gente poderia, na picaretagem. Isso os Artesãos não fazem. As apresentações foram canceladas...

E depois vêm os números das viradas. Êta que São Paulo tá virando gente!!! virando na rua, nos palcos. Tudo vira. Vamos virando sim..... um bando de picaretas se essa politica continuar.

Eles não sabem o que é o trabalho para a rua. Acham que é mais fácil, mais rápido e não precisa de nada. Nem de um antes, nem de transporte digno, nem de condições técnicas que vai de água até ter por perto um organizador responsável. Esses enganos está contaminando outros festivas. Os viradores estão fazendo carreira.

O Festival Visões Urbanas jamais deixou de receber os participantes de forma condigna, mesmo quando foi realizado sem praticamente verba nenhuma. Sabemos que peças vão ser apresentadas e o que os artistas precisam para realizá-las. Conhecemos as musicas de cada grupo e como eles se deslocam. Estamos presentes o tempo todo que dura o festival, bem como nossa equipe que é composta por artistas da companhia o que faz muita diferença. Ainda estamos aprendendo e queremos melhorar em muitas coisas, mas depois de vermos a virada nos orgulhamos de termos tão poucos recursos e recebermos os participantes tão bem.
Outra diferença é que nos dedicamos à isso o ano todo e não em dois dias apenas.

A cultura está precisando urgentemente de pessoas que, trabalhando nesses eventos, entendam que sua função é promover a arte e não cumprir tarefas como se fosse um burocrata. A cultura precisa de técnicos que não durmam no fundo dos teatros . De seguranças (já que estão lá) que entendam que um banco é diferente de um teatro. De especialistas em palco, luz e som para arte que é diferente de show. De profissionais que saibam lidar com os equipamentos dos teatros. Enfim. De pessoas especializadas para dar o suporte artístico necessário para cada trabalho.

Há muitas maneiras de matar a arte. Não dar condições física de apresentação aos artistas é uma delas.

Mirtes

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